Jean Wyllys foi forçado a fugir por causa das condições do regime ultra-reacionário do Governo Bolsonaro
Declaração da Corrente Comunista Revolucionária-CCR, 29 de janeiro de 2019, https://elmundosocialista.blogspot.com/
Jean Wyllys é professor, jornalista e político brasileiro. Ele foi notável como sendo o segundo membro abertamente gay do Brasil no parlamento brasileiro. Por seu trabalho, The Guardian comparou Wyllis ao político norte-americano pró-LGBT Harvey Milk. Wyllys foi reeleito para um terceiro mandato como vice na eleição de 2018. No entanto, em 24 de janeiro de 2019, poucos dias antes da posse do 56º Congresso, Wyllys divulgou uma nota do exterior afirmando que ele não assumirá seu cargo como deputado federal em fevereiro e que ele também não retornará ao Brasil devido a alegadas ameaças de morte.
A decisão de Wyllys de deixar o Brasil já existia há algum tempo. Mas o que tornou a decisão inevitável foi a denúncia de que o filho mais novo do presidente Jair Bolsonaro, Flavio Bolsonaro, tinha como assessores no seu gabinete como deputado estadual a mãe e a esposa do ex-policial Adriano da Nóbrega sob investigação por comandar grupos milicianos no estado do Rio de Janeiro. Nóbrega foi expulso da polícia e agora é um fugitivo. Nobrega também é suspeito de ser o autor do assassinato de Marielle Franco. Em resumo, há fortes evidências de que Bolsonaro e seus filhos vêm ganhando eleições nos últimos 30 anos com o apoio dessas milícias. As mesmas milícias acusadas do assassinato de Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes em março de 2018.
As milícias policiais brasileiras, no Rio de Janeiro e em outras cidades brasileiras, são grupos paramilitares clandestinos formados por atuais e ex-policiais que realizam atividades de vigilância e de crime organizado. Em algumas favelas do Rio, as milícias apoiadas pela polícia expulsaram os narcotraficantes, apenas para montar suas próprias proteções, extorquindo os moradores e taxando os serviços básicos. Essas milícias têm suas raízes nos esquadrões da morte da ditadura militar brasileira. Por causa de seus laços estreitos com a força policial, as milícias também desfrutam do apoio de certos políticos dos partidos de direita.
As conexões da família de Bolsonaro com essas milícias, elas não são novidades. Em dezembro de 2008, Bolsonaro elogiou as ações das milícias no Rio. Ele criticou a investigação da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, que verificou as atividades dos grupos paramilitares. A comissão pediu a denúncia de policiais, bombeiros e políticos que governavam favelas. A investigação mostrou que eles estavam lucrando com a cobrança de taxas, a oferta de serviços clandestinos e a venda de apoio político.
Foi nesse contexto tenebroso que Jean Wyllys percebeu que não havia mais condições de permanecer no Brasil. Abaixo publicamos parte de seu depoimento que explica sua decisão.
“No ano passado, as coisas pioraram. O assassinato da minha companheira e amiga pessoal Marielle Franco, conselheira do nosso partido no Rio de Janeiro, teve um impacto profundo em todos nós. Entendemos que não era brincadeira, que as ameaças eram sérias, que não podemos subestimar. Sentimos a dor profunda da perda de uma pessoa que amamos e que fazia parte de nossas vidas.
Assistimos ao espetáculo sujo das fake news, a mesma que me calunia, difama o nome de Marielle, acusando-a de ter relações com o narcotráfico. Vimos um candidato do partido de Bolsonaro (PSL) sendo saudado por uma multidão em uma manifestação fascista quando ele orgulhosamente exibiu uma placa rasgada com o nome de Marielle. Vimos este candidato ser o deputado estadual mais votado e o homem que o acompanhou nesta celebração macabra foi eleito governador (Wilson Witzel).
As ameaças aumentaram novamente, chegando até a minha família. Eu comecei a ter que sair em um carro blindado, com segurança armada. Eu vivi por meses como se estivesse em uma prisão particular sem cometer nenhum crime. Eu não podia ir a lugar nenhum sem os seguranças, nem mesmo fazer compras na mercearia ou visitar um amigo. Não saí do Brasil porque queria, fui obrigado.
Todos os meus movimentos eram restritos, limitados, guardados. Cheguei a viver pela metade, tornei-me escravo dos padrões de segurança necessários para proteger minha vida, enquanto aumentavam as ameaças e a difamação. Nos últimos dias, soubemos pela imprensa que o filho do presidente empregou em seu escritório a esposa e mãe do criminoso fugitivo que, segundo a polícia, é suspeito de liderar o grupo de assassinos que matou Marielle. Não posso ter certeza neste contexto, nem posso garantir a segurança das pessoas que trabalharam todos esses anos comigo, a quem agradeço imensamente por tudo.
Não saí do Brasil porque queria, fui obrigado. O país mergulhou em um pesadelo fascista pelo qual nossa permanência no país coloca nossas vidas em risco. Eu não quero ser um mártir. Eu não quero ser assassinado como Marielle.
O ex-presidente uruguaio, Pepe Mujica, quando soube da situação, me disse: "Rapaz, cuide-se! Mártires não são heróis". Eu não quero ser um mártir. Eu não quero ser assassinado como Marielle. Eu escolho ficar vivo, também para continuar lutando. Desistir do mandato e do país foi uma decisão difícil, dolorosa e triste. Eu desisti para proteger minha vida e recuperar minha liberdade para ir e vir, minha humanidade. Espero que essa decisão que tive que fazer abra os olhos de muitas pessoas, que o mundo veja a tragédia que está acontecendo no Brasil, um país que já estava feliz, esperançoso e orgulhoso de si mesmo, e hoje está submerso no ódio, mentiras e fascismo.
Não vou desistir de lutar, mesmo que seja de algum outro lugar, sem cargo oficial, de outras formas. Estou muito grato pela solidariedade recebida e espero que possamos recuperar e recuperar o nosso país deste estado de barbárie.
Não vou desistir de lutar, mesmo que seja de algum outro lugar, sem cargo oficial, de outras formas. Estou muito grato pela solidariedade recebida e espero que possamos nos recuperar e recuperar nosso país deste estado de barbárie. ”
Jean Wyllys