Governantes imperialistas e dirigentes africanos protestam contra o fim do regime reacionário – mas trabalhadores e oprimidos precisam tomar o poder em suas próprias mãos!
Declaração da Corrente Comunista Revolucionária Internacional (RCIT), 19 de agosto de 2020, www.thecommunists.net
1. O presidente do Mali, Ibrahim Boubacar Keita, anunciou sua renúncia na tarde desta terça-feira com efeito imediato – três anos antes do fim de seu mandato. Ele também declarou a dissolução de seu governo e da Assembleia Nacional. Horas antes, Keita, seu primeiro-ministro Boubou Cisse, assim como o ministro das Finanças Abdoulaye Daffe foram detidos por soldados amotinados e levados para uma base militar em Kati fora da capital Bamako.
2. Este motim é o mais recente evento desde que o Mali entrou em uma profunda crise política em maio, quando começaram os protestos em massa contra as eleições parlamentares fraudadas que apontavam uma grande vitória do partido de Keita Rassemblement pour le Mali (membro da chamada "Internacional Socialista") e seus aliados. Esses grandes protestos reivindicavam a renúncia de Keita e foram organizados pela coalizão M5-RFP – uma aliança burguesa de várias forças, como a Frente de Proteção da Democracia (FPD), organizações da sociedade civil sob a bandeira do Espoir Mali Koura (EMK), e a Coordenação de Movimentos, Associações e Simpatizantes (CMAS), liderada pelo influente clérigo muçulmano Mahmoud Dicko. Nas últimas semanas, o regime tentou, sem sucesso, esmagar os protestos com força bruta, resultando na morte de pelo menos 14 pessoas.
3. Nouhoum Togo, porta-voz da coalizão M5-RFP, sinalizou apoio ao motim e disse que não era "um golpe militar, mas uma insurreição popular". Houve também manifestações anti-governo espontâneas aplaudindo as ações dos soldados, e alguns incendiaram um prédio que pertence ao ministro da Justiça do Mali na capital. Há indícios de que o motim não foi iniciado pelo alto escalão do exército – que foi leal a Keita no passado – mas sim por soldados de baixo escalão. Estes soldados pegaram armas do arsenal no quartel em Kati e detiveram oficiais militares superiores antes de realizar o golpe.
4. Em contraste com as massas populares no Mali, as potências imperialistas e as classes dominantes da África reagiram com horror à queda de Keita. O ministro francês das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, disse no Twitter que a França "condena em termos mais fortes este grave evento.""J Peter Pham, enviado dos EUA ao Sahel, disse no Twitter que os EUA eram "contrários a todas as mudanças extra-constitucionais do governo". O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, exigiu a “restauração imediata da ordem constitucional e do Estado de Direito", e convocou uma reunião fechada do Conselho de Segurança da ONU para a tarde de hoje. Moussa Faki Mahamat, presidente da União Africana, disse que "energicamente", condena a prisão de Keita e Cisse e pediu "sua libertação imediata". A CEDEAO (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental) denunciou "a derrubada por soldados golpistas do governo democraticamente eleito", e ordenou o fechamento das fronteiras regionais com o Mali, assim como a suspensão de todos os fluxos financeiros entre o Mali e seus 15 Estados-membros.
5. A indignação das classes dominantes – tanto nas capitais imperialistas quanto na África – sobre a queda de Keita não é surpreendente. O governante caído tem sido fundamental para eles nos últimos anos, a fim de suprimir agitações populares e insurgências militantes na região. A MINUSMA – uma missão militar estrangeira com 15.600 soldados e policiais liderados pela França – é a segunda maior missão de paz da ONU no mundo. Ela efetivamente transformou o Mali em um país semi-ocupado desde o início da intervenção militar francesa no início de 2013, a fim de esmagar a insurgência no norte do país. Em janeiro de 2020, o presidente francês Macron convocou líderes sahelianas e os fez pedir "mais ajuda francesa". Como resultado, Paris criou a chamada "Operação Barkhane" / "Coalizão para o Sahel" – uma missão militar expandida sob o comando direto de Paris. Sem surpresa, a intervenção do antigo poder colonial tem provocado crescentes protestos populares no Mali. Desde o ano passado, várias manifestações ocorreram em protesto contra a presença das tropas imperialistas. De acordo com uma pesquisa em Bamako, em dezembro de 2019, mais de 80% da população tinha uma visão negativa da França e queria que Paris deixasse o país.
6. A Corrente Comunista Revolucionária Internacional (CCRI/RCIT) e outras organizações anti-imperialistas têm denunciado fortemente a intervenção imperialista desde o início. Explicamos que, em contraste com suas argumentações oficiais, tais missões militares lideradas pelo Ocidente não servem "à luta contra o terrorismo". Na verdade, seu propósito é apenas garantir os interesses políticos e econômicos do imperialismo francês e de outras Grandes Potências da região e manter as classes dominantes locais no poder. Além disso, tais missões militares devem impedir que os refugiados atravessem o Mar Mediterrâneo e entrem na Europa.
7. A CCRI não defende um golpe militar como um meio legítimo da luta de classes. Pedimos mobilizações populares, greves gerais e insurreição armada como métodos para derrubar regimes reacionários. No entanto, certamente não derramamos uma única lágrima para Keita – o governante fantoche caído a serviço do imperialismo francês e ocidental. Embora compreendamos completamente o alegrar-se das massas sobre o fim do regime de Keita, advertimos-lhes que o poder não deve permanecer nas mãos de pequenos grupos militares que não estão sob controle do povo. Da mesma forma, alertamos contra quaisquer manobras de políticos burgueses da oposição que possam tentar utilizar a situação para seu próprio propósito. Além disso, é provável que as Grandes Potências imperialistas e os governantes corruptos da região tentem manipular a situação a fim de garantir seus interesses.
8. Irmãos e irmãs, desconfiem de todos os generais, políticos e potências estrangeiras! Confie apenas em sua própria força de combate e em suas organizações! A CCRI convoca as massas populares a se organizarem em conselhos de ação em locais de trabalho, bairros, universidades e aldeias. Da mesma forma, é importante construir comitês de autodefesa – como primeiro passo para os trabalhadores e as milícias populares. Uma tarefa importante da luta atual é expulsar as tropas imperialistas e seus aliados locais! Fechem todas as bases militares estrangeiras! O poder não deve ser deixado nas mãos do exército ou de políticos corruptos. É urgente criar um governo de operário e camponeses pobres baseado em comitês populares de ação. Da mesma forma, as massas insurgentes deveriam convocar uma Assembleia Constituinte Revolucionária. Tal perspectiva faz parte da nossa luta por uma África unida e socialista livre da opressão imperialista e da exploração capitalista!
Secretariado Internacional da CCRI
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Para a análise da RCIT sobre a África e a intervenção imperialista, encaminhamos os leitores aos nossos inúmeros artigos e declarações que são publicados em nosso site em: https://www.thecommunists.net/worldwide/africa-and-middle-east/
Em particular, nos referimos a:
Abaixo o neocolonialismo francês na África Ocidental! Protesto contra o imperialista "Operação Barkhane" / "Coalizão pelo Sahel"! Declaração Conjunta das Organizações Anti-Imperialistas e Socialistas, 12 de fevereiro de 2020, https://www.thecommunists.net/worldwide/africa-and-middle-east/joint-statement-down-with-french-neo-colonialism-in-west-africa/
RCIT: Expulsar o imperialismo francês da África Ocidental! Macron e seus lacaios do G5 planejam intensificar sua "Operação Barkhane" colonialista, 15 de janeiro de 2020, https://www.thecommunists.net/worldwide/africa-and-middle-east/expel-french-imperialism-from-west-africa/
RCIT: Imperialismo francês Lambe suas Feridas. 13 soldados franceses morreram no Mali durante a missão de combate colonialista, em 29 de novembro de 2019, https://www.thecommunists.net/worldwide/africa-and-middle-east/mali-french-imperialism-lick-its-wounds/
RCIT: Somália: Expulsem as Forças de Ocupação AMISOM e Ocidental! Ousado ataque de guerrilha contra base do exército dos EUA e comboio militar da UE, 30 de setembro de 2019,
RCIT: Manifesto para a Libertação Revolucionária da África Negra, https://www.thecommunists.net/home/portugu%C3%AAs/ccri-manifesto-pela-libertacao-revolucionaria-da-africa-negra/